Era uma tarde fria de Janeiro. Daqueles
dias em que o sol não nos brinda e, em vez disso, a chuva teima em
cair. Noutras circunstâncias, não teria saído de casa. Era domingo
e como adorava passar os domingos de chuva no sofá, enrolado numa
manta quente a ver o lume queimar lentamente os pedaços de lenha.
Fui ao seu encontro porque assim tinha
de ser. Entrei a medo. A cada passo que dava, ouvia o ranger da
madeira debaixo dos pés. Sentia o meu coração bater cada vez mais.
Pela minha mente passaram mil sonhos, outras tantas recordações e
quantas vezes pensei desistir. Mas não podia!
- Está ali, como sempre. Acho que é o
único sítio onde se sente melhor. – disse-me a Catarina,
apontando na sua direção.
Lá estava ela. Sentada numa cadeira,
junto à janela, com um pequeno xaile pelas costas. Olhava a chuva
enquanto a cadeira balouçava levemente. A sua pele parecia macia,
como antigamente, mas agora coberta de rugas - as marcas de um tempo
que não poupa ninguém (nem mesmo a ela!) e de um sofrimento atroz. Os olhos estavam vidrados, um olhar profundo, provavelmente imerso em
recordações de outros tempos. Os seus caracóis, de que tanto
gostava, estavam apanhados com um pequeno travessão que os deixava
cair quase ao nível dos ombros, livres e amachucados como noutras
alturas nunca teria permitido. Pousava a mão direita sobre um
pequeno caderno de apontamentos que me transportou de imediato para
aquele dia. Como podia conservá-lo ainda? Não seria pior assim?
Avancei alguns passos na sua direção.
Parecia não ter dado pela minha presença, porém, mesmo antes de a
alcançar, sussurrou:
- Lembras-te do que fazíamos nestes
dias de chuva?
Comentários
Enviar um comentário